domingo, 15 de agosto de 2010

Parafuso chato invertido de P-47



Do efetivo do 20 Esquadrão Pif-Paf da Base Aérea de Santa Cruz, com 50 horas de vôo no P-47 Thunderbolt, considerava-me conhecedor de todos os seu segredos.
Ao meio dia de 14 de abril de 1948, no P-47 4141, iniciei, a partir de 30.000 pés, picada para ganhar velocidade para uma Curva de Immmelman.


Adquirida a velocidade, veio a puxada para executar a manobra. O sol estava a pino o que me ofuscou a linha do horizonte. Desvirei, ainda com o nariz alto, o que provocou a entrada em parafuso.

Por estar sem as 8 metralhadoras, portanto mais leve, a subida até 30.000 pés para realizar manobras e acrobacias a grande altitude, foi rápida, tendo gasto pouco combustível do tanque auxiliar. Com tanque auxiliar quase cheio, o centro de gravidade deslocado, não era aconselhável executar acrobacias, recomendação essa que só tivemos conhecimento após o acidente que estamos relatando.

Já em parafuso, achei que seria barbada retornar ao vôo normal. estava enganado. Fiz todos os procedimentos para tirar do parafuso, sem resultado. Atochei a manete dos gases e, então houve uma inversão brusca no sentido do parafuso, o que resultou uma forte batida da minha testa no canopy. Naquela época usávamos um capacete de lona, aonde a máscara de oxigênio se prendia.

Com a batida, apaguei. Nessa altura, com a manete para frente, o P-47 entrou num parafuso chato invertido. O sangue voltou logo para a cabeça o que provocou em poucos segundos, a visão vermelha. Antes, porem, pude ver no altímetro que estava cruzando 10.000 pés, altura determinada para abandonar o caça, caso não conseguisse sair do parafuso.

Nem com o auxílio das pernas consegui segurar o manche. Os paloniers (pedais), em movimentos rápidos, iam a fundo e voltavam para trás.

Não havendo mais possibilidade de sair do parafuso chato, levei a mão à alavanca de emergência do canopy, tendo o mesmo imediatamente sido ejetado pela força centrífuga. Com muito esforço, usando os dois braços para trazê-los à barriga e abrir o cinto de segurança, fui ejetado da cadeira pela mesma força centrífuga. Achei que seria pego pela empenagem, mas felizmente não o fui.

Como o meu corpo girava bastante, não puxei logo a argola de abertura do pára-quedas. Abri os braços, o P-47, em parafuso com o motor acelerado, passou diversas vezes por mim. Sorte não ter aberto logo o pára-quedas. Quando parei de girar e sentindo que o P-47 já estava mais longe, abri o pára-quedas, aproximadamente a 5.000 pés.

Fiz uma inspeção para ver os estragos que teria sofrido. Sangue ofuscando parte da visão, corte no pescoço e, à primeira vista, sem os pés, no que foi logo observado com satisfação que somente tinha perdido os sapatos.

Olho para baixo e vejo o P-47 ainda em parafuso atingir o solo, num laranjal em Sepetiba. Vejo a torre da Radiobrás bem abaixo de mim.

“Glisso” com o pára-quedas, ora para um lado ora para o outro para desviar da torre e do lodo da Baía de Sepetiba, até tocar o solo em um outro laranjal a uns 500 metros do local em que caiu o P-47.

A emoção foi tão grande de estar vivo que levou-me a beijar o chão. O ten. Barbosa, mais conhecido como “Boquinha”, grande amigo, no SAR (Servico de Busca e Salvamento) Santa Cruz, saiu em uma moto Indian para me achar. O terreno era difícil para moto, o que resultou em um desastroso tombo.

Quando chegamos à Base, disse-lhe: “eu salto de pára-quedas e você que se quebra seu desastrado”. Abraços dos amigos da querida Base de Santra Cruz. Daí por diante passei a chamar o Thunderbolt de “Senhor”; havia perdido, por algum tempo, a intimidade com o P-47, aeronave que tenho orgulho de ter voado mais de 800 horas.

Cel.Av.Ref. João Luiz Moreira da Fonseca
Piloto de Caça – Turma de 1947

FONTE: APRA-PC – Associação Brasileira dos Pilotos de Caça

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Fonte: Poder Aéreo


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